Transformações Humanas
Muita paz a todos! Nesta noite, nós vamos tratar de um assunto de grande interesse de todos nós, que é aquele pertinente à nossa transformação.
A proposta espírita visa, basicamente, a transformação do homem. Para que nós saiamos de uma situação espiritual inferior e marchemos para uma realidade espiritual mais avançada. É, dessa forma, que alguns estudiosos da questão, ligados à psicologia, começaram a estudar, nas terras da Europa, esse problema da transformação humana. Chegaram a algumas conclusões referentes aos níveis de transformações por que pode passar o indivíduo.
As transformações se processam de alguma forma bastante peculiar. A primeira delas, nós chamaremos de transformação efêmera. Como o nome já informa, é esse gênero de transformações da personalidade, que não tem caráter de fixidez, que não se demora, que não se alonga.
O indivíduo pode passar por uma transformação efêmera no momento em que se aborrece, por exemplo. Muda de personalidade, fica agressivo, fica violento. Daqui a pouco está calmo ou, outras vezes, o indivíduo que ingere álcool, muda a personalidade: se ele é agitado fica apático ou mais agitado; se ele é apático, fica saliente; fica falante se ele é mudo; fica mudo se é falante.
O álcool age, nas suas engrenagens cerebrais, determinando alterações nas suas funções psíquicas e psicológicas. Ai, nós temos/teremos as transformações efêmeras, aquelas que, como o nome diz, processam de modo rápido, duram pouco tempo nas estruturas da vida da pessoa.
Após, nós encontraremos um outro tipo de transformação que é a chamada transformação patológica. A transformação patológica, como também admitimos a partir do título, ocorre quando o indivíduo, por algum processo de enfermidade, por alguma patologia modifica a sua personalidade. Quando nós lidamos com pessoa esclerosada, não identificamos nela aquela pessoa, de algum tempo atrás, antes da piora do processo, ou antes, do próprio processo. O indivíduo que tinha um comportamento social, na esclerose, passa a ter um comportamento, até antissocial.
Encontramos casos variados de pessoas que tinham uma boa relação humana mas, na fase da esclerose, fica insuportável de se lidar com ela. Então, houve uma mudança na sua personalidade; na sua maneira de ser houve uma transformação, mas de caráter patológico.
O indivíduo que sofre uma cirurgia cerebral, durante um bom tempo, na fase da convalescência, é outra pessoa. Diz coisas que não costumava dizer, na sua faixa normal. A família diz: Minha mãe nunca foi disso; - minha avó nunca foi disso; - meu filho nunca foi assim. Mas, por ter sido mexido o cérebro, alterando-lhe certas disposições, o ser que utiliza desse implemento alterado, passa a transmitir uma mensagem que não era a sua comum mensagem. Então, entendemos que alguém, em processo de enfermidade, transforma a sua personalidade.
Sem que se chegue às raias de uma enfermidade grave, imaginemo-lo com uma crise de fígado, que se vai definindo como uma cólica hepática. Então, muda uma personalidade. Só que, nesse caso, é uma transformação patológica. Ela se torna efêmera porque vai durar o tempo que durar a cólica. Alguém com uma dor de dente. Quem é que tem bom humor com dor de dente?Nós vemos que, embora seja uma transformação patológica, ela se torna efêmera porque a dor de dente não vai durar um longo período.
Então, sabemos distinguir uma transformação efêmera, propriamente, de uma transformação patológica, propriamente, e as patologias, de rápido curso, que tornam a transformação de caráter passageiro como essas dores ou esses problemas que acabamos de citar.
Vamos achar, mais adiante, uma outra marca de transformações que foi chamada de transformação intelectual. Em que se baseia essa transformação? Baseia-se no fato de que um indivíduo muda seu caráter a partir de certas ingestões intelectuais. Certas pessoas leem determinado livro, se encantam com a ideia do autor e passam, agora, a dirigir suas vidas e a vivenciar, de acordo com aquela ideia que a literatura lhe trouxe.
O indivíduo que tivesse lido Marx, por exemplo, e se encantado com as teorias de O Capital, com as teorias marxistas, passaria a adotar o comportamento intelectual marxista; passaria a dizer-se materialista; passaria a afirmar-se, nas questões econômicas, somente através do pensamento de Marx. Todas as suas atividades estariam marcadas por esse sabor marxista.
Mas, se outro indivíduo lê, por exemplo, a obra de Freud. Começaria a raciocinar e a desenvolver sua vida (se se encantasse com Freud) a partir da sua touceira psicanalítica e a tornaria sua postura, pelo menos a postura teórica que ele cita, que ele apresenta nas obras. O indivíduo se diria freudiano. Seu discurso, sua maneira de falar, a forma de se conduzir, demonstraria que ele adota a postura freudiana, a postura psicanalítica da escola de Freud.
vemos como o indivíduo pode mudar intelectualmente. Se de repente, aparece-nos um ídolo, um artista que usa determinado linguajar e nos encantamos com esse linguajar, passaremos a adotá-lo. Houve uma transformação da nossa personalidade porque antes, não usávamos aqueles termos, não usávamos aqueles trejeitos, não usávamos aquela gíria.
Quem é que não falou, na época áurea do Roberto Carlos, é uma brasa, mora. Todo mundo falou é uma brasa! Até hoje, adotamos esse verbete e essa expressão ou essa informação, desde que surgiu, por parte daquele ídolo da música popular brasileira, como era aquela época.
Então, vemos como vão se dando transformações, em nível intelectual que, muitas vezes, nós não nos damos conta. Mas, quem nos conheceu antes e agora nos está vendo: - Afinal, o que é que deu em Fulano? - Que aconteceu com Fulano? - Fulano não é assim, não falava assim, não se vestia assim, não andava desse jeito.
Encontramos, na pauta da nossa vida, diversas transformações em nível intelectual. Seja intelectual de uma leitura, um curso que alguém faça ou de uma situação como essa, que a gente acompanha o ídolo da música, ou o ídolo do esporte ou ídolo disso ou daquilo. E passamos a viver certas impressões como ele nos apresenta. Encontraremos, nessa transformação intelectual, diversos indivíduos que nós conhecemos bem de perto.
Conhecemos, por exemplo, os nossos amigos, nossos jovens quando entram para a Universidade. Eles ficam insuportáveis, com raras exceções, porque passam a ser os donos da verdade. Se nós notarmos o acadêmico de medicina, por exemplo, no primeiro semestre de faculdade, ainda com a cabeça raspada, ele só anda de branco na rua, de estetoscópio no pescoço, talvez dois e os livros dessa grossura com o título para todo mundo ler, o que nem ele sabe.
Aquilo mexe na sua personalidade. Todos têm que ver e ele, afinal de contas é doutor e nós... coisa nenhuma! Ninguém pode formar-se e virar doutor. A gente chama de doutor por uma distração da sociedade. Mas, doutor é quem estuda, que faz doutorado. Ele será médico. Doutor, a gente é que chama. Como advogado ainda não é doutor. A gente chama por hábito, mas ele é Seu Fulano, é bacharel, mas não é doutor, não. Doutor é quem faz doutorado.
Vemos que essa entrada na Universidade gera modificações em nível intelectual. O indivíduo olha os outros assim, de cima. E quando chega o pai (o pobre coitado, lavrador) em casa... -Esse meu pai, agora, não sabe nada. Ele já entrou para a faculdade!
Tivemos ensejo de conversar com vários desses indivíduos, sofrendo de transformação intelectual das mais falidas. Um companheiro que eu tive na Mocidade Espírita; encontrei com ele, certa vez, e disse: - Por que você sumiu? Ele: - Agora? Agora, não tenho tempo, rapaz! Um médico não pode se meter com esse negócio. A ciência não se acerta com o Espiritismo, não!
– Mas, o que é que você está dizendo?
– É a ciência! Eu agora sou cientista!
–Quando foi que médico é cientista? Médico é médico.
– Não, mas eu não posso mais me meter com Espiritismo, não. Eu, agora, sou materialista!
Eu perguntei para ele: - Você pode me dizer o que significa o sufixo –ista, da palavra materialista? Ele ficou lívido! Olhou para um lado, olhou para outro, ficou vermelho.
Aí, eu disse: - Não,você não sabe. –
É. Isso não caiu no vestibular! Como não caiu no vestibular, ele não tinha obrigação de saber.
Começamos a pensar que há muitas transformações intelectuais de superfície! As pessoas não sabem o que dizem que sabem! E, infelizmente, meus irmãos, esse pseudointelectualismo – porque há transformações intelectuais de fato, mas há pseudotransformações – esse pseudointelectualismo penetrou no nosso Movimento Espírita.
No nosso Movimento Espírita, encontramos a Doutrina que tem a maior literatura do Ocidente. Nenhuma outra religião tem a literatura que nós temos, de profundidade, de conteúdo. No entanto, nós os Espíritas lemos pouquíssimo! Chegamos na casa dos espíritas e achamos livros espíritas com autógrafos, mas nunca lidos. Pelo nível de questões que o público espírita nos traz, sabemos que eles não leem. Não é não estudam porque estudar é um pouco mais que ler. Eles, simplesmente, não leem! Limitam-se a ouvir; estão satisfeitos da vida. Não leem. Todos se abalançam em orientar. Difícil o indivíduo espírita que não seja orientador. Ele levanta e fala e, se botar alguém que não o conhece, aí ele fica o doutor em Espiritismo.
Visitei uma Instituição e, no primeiro contato, eu notei que o dirigente era obtuso em conhecimento espírita. Não conhecia nada, mas era dirigente. Nós temos o outro lado. Como ninguém tem coragem de assumir os trabalhos da Casa Espírita, a gente põe lá o sujeito que trabalha, mesmo que não conheça Espiritismo. Queremos ficar livres daquele serviço. Então, a gente fica criticando, por trás, mas não quer assumir a postura que dá trabalho.
O que acontece? O cidadão... (eu estava de lado observando)... chegou uma senhora, conversou com ele, disse que estava com dificuldades mediúnicas e tudo o mais. Ele orientou, falou um monte de coisas (que eu nunca tinha lido no Livro dos Médiuns), mas ele estava falando. Indicou banho de sal grosso para ela, banho de sal fino, sei lá do quê! E, eu estou escutando. Quando, aí, chegou uma jovem e ficou olhando para ele. Como se ele tivesse que adivinhar o que estava sofrendo, vivendo (o povo faz isso mesmo). E ele abriu um olho, fechou o outro, piscou e disse assim: - Você é média! (Meu Deus do Céu, até que a moça é alta. Ele está dizendo que ela é média.) – Você tem que desenvolver!
Eu fiquei pensando, cá com os meus botões: -Como é que ele sabe que ela é média? Pelo visto ele não deve conhecê-la. - Como é que assim, de primeira vez, ele já conseguiu dizer que ela é média? E, além de tudo errando o termo! No Espiritismo não existe média, existe médium (comum de dois gêneros: o médium, a médium). Não existe média, nem médio. Existe médium (com –m no fim). Aquilo já era mais um caso que eu acompanhava.
As pessoas fazem o maior estardalhaço com o que não conhecem. Como alguém se abalança a dar uma informação de que não tem certeza? Atormenta a vida da criatura, perturba a vida da pessoa.
Há outros que dizem: - Ah, eu fui a tal Centro, meu irmão, e lá o dirigente disse que a minha mediunidade é de terreiro, meu guia é de terreiro. Eu disse: - O que é que você acha? – Ah eu vou pro terreiro. – Então, vá para o terreiro. A pessoa acreditou, aceitou.
Imaginemos se viéssemos para a Terra com mediunidade de terreiro e mediunidade de mesa, como o povo diz. Não existe isso, não! Existe a mediunidade.
É como se a gente dissesse que existe telefone de quintal, telefone de sala de visita. Não existe. Existe telefone. Eu o ponho onde eu quiser. Se o lugar onde eu me acomodo mais é no quarto, levo o telefone para o quarto; se o lugar que eu me acomodo mais é na sala, levo o telefone para a sala, na cozinha ou na área de serviço.
A mediunidade, o médium é o telefone. Se ele sintoniza com as entidades que se ligam aos terreiros, ele vai para lá, mas não que a sua mediunidade o exija. Ele é que gosta. Então, ele vai para lá. E, agora, seu aparelho telefônico, sua mediunidade vai ser usada naquele contexto. Lá que ele gosta; é lá que ele quer ficar.
E, se aquele outro indivíduo já não sintoniza com aquela frequência, com aquela faixa, com aquela prática, sintoniza com essa de cá, com o Centro Espírita. Gosta de uma coisa mais tranquila; gosta da oração. Ele vem pra cá. Por que é que certos indivíduos dizem para as pessoas: - Você é médium de terreiro! – Você é médium de mesa! Não existe isso no Espiritismo.
Ali se assentam, em redor da mesa, para ter apoio. Mas, o médium espírita pode se sentar numa cadeira sem mesa. Só para ter apoio, para poder não se cansar tanto, mas, não que haja necessidade mesmo. Agora, se alguém vai escrever, precisa ter um apoio para escrever.
O que nós queremos demonstrar é que não tem nada tem que ser assim. Deve ser por isso porque não precisa ser por aquilo. Então, há muitos pseudointelectuais na nossa faixa do Movimento Espírita.
Há indivíduos que têm a petulância de dizer: - O Evangelho diz! Aí, eu fico imaginando onde é que o Evangelho diz aquilo. Modéstia à parte, eu li esse Evangelho algumas vezes e, algumas passagens eu tenho até de memória. E o indivíduo assim: - Fora da Caridade não há salvação, como disse Jesus. Eu digo: Mas onde é que está isso? Não foi Jesus que falou isso. Colocam na boca de Jesus o que é de Kardec.
Muita gente diz: - Meu irmão, como está na Bíblia A mil chegarás, de dois mil não passarás. Onde é que está isso na Bíblia? Isso é apócrifo, isso é da tradição popular. Não existe essa frase na Bíblia. Isso é lendário. As pessoas costumam se atribuir uma intelectualidade que não têm.
Seria tão fácil, quando alguém me pergunte algo que eu não saiba: - Olha, isso eu não sei; vou procurar no livro e vou lhe informar. Ou, então: -Leia tal livro que lá deve ter. Eu nunca li, nunca vi. Eu sei que a Doutrina fala sobre isso, mas eu nunca vi. Para que assim não dê respostas erradas às pessoas que estão confiando em nós.
Quando eu comecei na Doutrina Espírita, no Movimento Espírita, (começamos a educar a mediunidade na juventude), um cidadão que eu participava da reunião e que era espírita (há mais de quarenta anos), olhou pra mim, se encantou comigo e ficamos amigos. Até que um dia ele disse: - Raul, você deseja ser um bom médium? Eu digo: - Claro. – Bom, mesmo? – Claro. – Mas, você quer mesmo ser médium? – Pelo amor de Deus, me diga o que eu tenho que fazer? – Deixe de comer carne.
Eu digo: Mas, tudo? – Tudo. Você não pode comer nem carne de gado (bovino), nem de suíno, nem de ovino. Você não pode comer aves, nem ovo. Do ovo você só pode comer a gema cozida. A clara não, tem muita albumina. Deixou-me com a parte pior que tem muito colesterol. Você não pode comer nem peixe.
Cheguei em casa e, a partir daquela noite, já não comia a comida que era feita com gordura animal. Então, imaginemos a casa de pobre, o transtorno que a gente cria quando começa com esse negócio isso come, não come aqueloutro, porque todo mundo come a mesma comida. Então, vocês imaginam o transtorno que eu criei.
O tempo passou. Um ano. Eu estava de olheiras. Com rosto largo, estrutura óssea larga. Eu emagreci demais. Fiquei uma coisa. A memória começou a falhar. Foi me dando aquela coisa. Eu estava um decrépito, mas não comia nada. Alface ao molho pardo.
Todas as reuniões eu me encontrava com o companheiro lá e dizia: - Como é que está minha mediunidade? – Ah, tenha fé! Eu estava com mais fé do que mediunidade. E, à medida que o tempo foi passando, eu estava me acabando.
Até que no sábado, depois de um ano, eu me defrontei com a orientadora da Mocidade. Ela me olhou e disse: - O que é que você tem? Eu disse: - Fome. Contei a ela o que tinha acontecido. – Aquele cidadão? – Foi. – E, por que você foi na conversa dele? – Mas, eu quero ser bom médium. Ela disse: - Você vai ser é um bom espírito, vai morrer. – Pelo amor de Deus, como é que eu faço? Passa em casa, segunda-feira. Era sábado (dia da Mocidade), na segunda eu passei na hora do almoço (olha a coincidência). Ela me atendeu na sua casa (tinha tempo que eu não ia lá), mandou me assentar na sala e foi pra cozinha. E eu estou sentindo aquele cheiro de bife, a escutar a frigideira frigindo. Eu digo: - Meu Deus, eu vou perder a minha mediunidade. E daqui a pouco, lá vem ela com um bife maior que o prato.
– Coma.
– Não posso.
– Coma!
– Não precisa gritar que eu como. A boca se me encheu de água. Mas, depois que eu comi me veio o conflito porque eu queria ser um bom médium! Adolescente com dezessete anos. Eu fiquei naquele conflito de que tinha fugido ao compromisso. E, ela me disse:
- Vai comer carne porque senão vai ter um problema de saúde.
Resultado: cheguei em casa, com aquele desespero na alma, porque o cidadão tinha conseguido me influenciar. Cheguei em casa naquela tormenta. À noite, fui deitar e não dormia, virava para um lado, virava para outro.
Como eu tenho sempre O Livro dos Espíritos na minha cabeceira, desde o primeiro dia que me tornei espírita, é nele que eu tiro as minhas dúvidas, eu falei assim:
- Bom, os primeiros cristãos costumavam jogar o rolo de papiro sobre a mesa e deixar ao vento e ver o que vinha escrito, ao comentário dos profetas e, depois de Jesus, aos ensinos do Mestre. Deixa eu abrir O Livro dos Espíritos; quem sabe me vem uma resposta para aplacar essa minha agonia?
Eu estava com remorso, mas não tinha certeza. Meus irmãos, eu abri O Livro dos Espíritos e meus olhos se detiveram na questão 723.
Eu achei, naquele momento, que Allan Kardec tinha feito aquela pergunta para mim, sabendo que, um dia, eu ia ter aquela dúvida, de tanto que a questão me atendeu a ansiedade. Kardec perguntava sobre a alimentação à base de carne e o Espírito de Verdade respondia: a carne se alimenta da carne; o homem deve alimentar-se de acordo como exija a sua organização.
Eu vibrei aí. Chorei de emoção. Já tinha lido O Livro dos Espíritos, mas aquela pergunta, naquele momento, parecia estranha para mim e eu estava conhecendo agora. A partir disso, comecei a entender que, no meio espírita, que no Movimento Espírita tem muita gente louca.
Eu imaginava que os espíritas fossem espíritos puros, almas santas, até que eu comecei a entender que há muita gente louca. E comecei a entender mais. É por isso que a gente é espírita! Porque para conseguirmos andar um pouquinho sempre tem Espiritismo, de tão atormentados que somos. Para doentes graves, remédios fortes. O Espiritismo é o remédio mais forte para a doença enraizada e cronificada de cada um de nós.
Há muitos pseudosábios em nosso Movimento. Muito cuidado! Quando tivermos dúvida doutrinária – é na Doutrina que a gente retira; é lendo Kardec. E o que vamos perguntar é o texto que a gente não entendeu, é a orientação que a gente não compreendeu, é o termo que a gente não entendeu. Mas, é ali que vamos achar a resposta.
Mas, depois dessa transformação intelectual, aparece-nos a transformação moral. Essa transformação moral tem uma característica bastante interessante. Ela se dá quando o indivíduo observa fenômenos externos. Ele nota determinada coisa e esse fenômeno externo o impede de viver. Aí ele muda o comportamento a partir do que viu. Vamos dar um exemplo.
Estamos andando, pelas ruas de Campo Mourão, em um dia frio, e vemos um bando de meninos descalços, nus, só de shortinho, tiritando de frio. Aquilo nos condói. Pensamos naquela quantidade de roupa, que temos guardada na gaveta, que já não cabe em nossos filhos e aquelas crianças ali. Nós estamos guardando para as traças, ou para um neto, ou para quando tiver outro menino! E a necessidade ali premente, naquela hora. Aquilo nos comove.
Eu digo assim:- O quê? Eu ficar guardando aquela roupa e esse menino morrendo de frio? E vou para casa, pego a roupa e levo. Vejamos: houve uma transformação de visão moral do indivíduo. Até ali, ele achava que ia guardar. Um fato externo mexeu com a sua sensibilidade e ele modificou-se.
Nós passamos e olhamos pessoas disputando com cães, nas latas de lixo, o que elas vão comer. E, a gente, na nossa casa, está com a geladeira abarrotada de Danoninho para os nossos filhos comerem para depois não querer almoçar. Rateiam, comem um pouquinho a sua comida, no prato, vai tudo pro lixo.
Quando vemos aquele povo catando restos, na lata de lixo, passamos a fazer um pacto: Na minha casa não se joga mais comida; meus filhos vão, se puser no prato, vão comer. E, aquilo que a gente dizia Não como, no jantar, o que foi sobra do almoço – vamos a aprender a valorizar. O dia que a gente não comer, passar para as mãos de alguém que possa comer e aproveitar. Vejamos como essa visão da tormenta nos sensibilizou, nos modificando a maneira de ser, a partir do que vimos no exterior, do que ouvimos no exterior. Então, o lado externo nos modifica internamente.
Dentro desse quadro de transformação moral poderemos lembrar a vida de Léon Tolstoi. Tolstoi era filho de uma família muito rica, na Rússia, família de príncipes e era herdeiro muito rico. Muito jovem, ele foi consagrado o maior escritor romancista de todas as Rússias.
Tolstoi vivia uma tormenta; sentia-se enormemente infeliz. Embrenhava-se por sua propriedade Yasnaya Polyana. Yasnaya Polyana era uma região, do interior da Rússia, onde ele tinha uma grande propriedade. Lá, os seus servidores, empregados, trabalhavam na neve. A região é muito fria, de muita neve, mas com o mínimo de cobertura. As botas perfuradas, naquele frio, os casacos de forro roto, as roupas mal cuidadas, uma alimentação deficiente naquele frio é terrível. Ele notava que as pessoas não o tratavam bem; seus empregados o tratavam por obrigação; o cumprimentavam por obrigação, mas todos mal encarados, atormentados, abusados.
Tolstoi continuava a viver a tormenta. Abandonou a igreja oficial da Rússia e passou a adotar uma outra postura de fé. Escreveu um livro falando da nova fé que ele adotara. Aí, a igreja tradicional da Rússia caiu em cima de Léon Tolstoi porque, agora, ele muito rico, já fazia parte das suas hostes e, ela não perdoou: crivou de críticas e censuras. Cada dia, ele ia se sentindo mais atormentado até que pensou em se matar.
Começou a pensar na ideia da morte, anos a fio, entre a covardia e o impulso de matar-se. Até que, no auge da crise, ele resolveu esconder-se em um templo em Yasnaya para aliviar a mente, descansar o espírito. Ali, em Yasnaya ele se debruçava na janela para ver o movimento de seus empregados e começou a se condoer. Ao ver a neve cair e aquelas pessoas mal protegidas, trabalhando para ele. Eram elas que mantinham a sua riqueza naquela propriedade.
Ele começou a pensar:- Mas, se eu quero me matar, por que é que eu não aplico meu tempo com essas pessoas que são muito desvalidas. A minha propriedade é bem mantida por eles e eu estou querendo me matar, sem deixar nada para eles. Tolstoi começou a sofrer essa transformação moral, depois de parar e ver como viviam seus empregados. Começou a aplicar dinheiro ali. Construiu escolas, na propriedade, para atender aos seus funcionários. Começou a mudar as roupas; adquiriu roupas novas, botas novas para seus empregados. Tinha dinheiro para isso. Começou a melhorar o nível da alimentação de seus empregados.
Começou a notar, com uma positiva estranheza, que agora os seus empregados o cumprimentavam com um sorriso. Agora, crianças corriam ao seu encontro quando o viam passar. Ele começou a sentir-se eufórico com a euforia de seus servidores. Agora, aquelas mulheres vinham trazer, para ele, o que elas tinham feito em casa com as coisas da fazenda, da propriedade; vinham trazer-lhe flores; mandavam as crianças levar flores colhidas no jardim.
Fim da primeira parte.